quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Leishmaniose visceral e PL 1738/2011 - vacinação canina compulsória

Prezados!

Convido a todos à "saborosa" leitura do Projeto de Lei n.1738/2011 que tramita na Câmara dos Deputados sobre a vacinação compulsória de cães contra a leishmaniose, proposto pelo deputado e médico Geraldo Resende (PMDB / MS).

O texto pode ser acessado na íntegra (versão .pdf aqui) e o trâmite pode ser acompanhado diretamente na página do Projeto de Lei (aqui).

Recomendo que leia o Projeto e depois prossiga a leitura do post...

Estamos falando de uma zoonose ultra polêmica cujas ações de controle não têm servido de muita coisa.  Tenho muitas perguntas quanto ao PL e seus efeitos. Eu, particularmente, tenho muita "revolta" quanto à leishmaniose visceral, justamente pela falta de respostas e excesso de perguntas. É necessário pensar muito! É uma doença em que muitos agem mas poucos pensam. Ninguém divulga efeitos reais das ações de controle, isso me preocupa muito. Não será hora de trabalhar no bom e velho controle integrado? Cadê a tríade / cadeia epidemiológica, gente?! PENSEM! Chega de só "apagar fogo" nesse país. Na saúde - pública ou não - só se faz apagar incêndios. Precisamos de ações com início, meio e fim, totalmente planejadas, auditadas e avaliadas! Para montar um projeto de pesquisa a pessoa tem que pensar muito, delinear tudo e prever tudo - para que não haja furos. Por quê não usar esse bom modelo para "desenhar" a saúde pública no Brasil? Não me venham com as conversas de "academia é uma coisa, mundo real é outra". PENSAR é imprescindível! E colocar especialistas para brigar sobre tratamento de leishmaniose em cães definitivamente NÃO é a questão. Especialistas devem deliberar e propor planos inteiros e não apagar fogo ou defender pontos específicos. PENSEM! Não dói nada!

As dúvidas - totalmente pessoais:

- Em que pé estão os testes de vacina anti-Leish - já fizeram todas as etapas? Temos os dados completos da eficácia vacinal, efeitos colaterais, validação...???

- QUAL das vacinas será utilizada - melhor, que laboratório ganhará com essa?
- De onde vem a verba para a campanha?
- Será utilizado o protocolo de teste - sorologia - dos animais (claro, dependendo da vacina utilizada)?
- Em que testes podemos mesmo confiar?
- Quanto às reações cruzadas, o que me falam a respeito dos Trypanosoma da vida, tão comuns em várias regiões do Brasil?
- Como será avaliado, a curto, médio e longo prazo, o efeito da vacinação na redução de casos humanos?
- Em cidades sem CCZ, quem / que órgãos serão os responsáveis pela vacinação?
- Em cidades / regiões ainda livres de LV... a vacinação também será compulsória?
- Como garantirão a adesão da população à campanha - considerando que as campanhas contra raiva têm cada vez menor adesão e também, falando em saúde pública em CG, as consequências nefastas do caso de raiva urbana no último mês de agosto?
- Serão integradas outras ações de controle?

O texto trata da "Política Nacional de Vacinação contra a Leishmaniose animal". Senhores!!!!! SENHORES! Por que não a "POLÍTICA NACIONAL DE CONTROLE DA LEISHMANIOSE HUMANA E ANIMAL"????? CONTROLE! Humanos E animais! Ações conjuntas, simples e complexas, para diminuir incidência E prevalência! SÓ VACINAR CACHORRO ainda é apagar fogo. Concordo e entendo que, no controle de leishmaniose, diversas esferas devem trabalhar juntas. Qual é o grande desafio em colocar a Vigilância Ambiental, Vigilância Epidemiológica, Secretaria de Agricultura e (quando houver) CCZs trabalhando juntos por uma saúde pública? Sabe qual o grande desafio? 
P O L Í T I C A.

Ah sim, mais uma dúvida. Como se trata de vacina de uso animal, a "brincadeira" é do MAPA (Min. Agricultura, Pecuária e Abastecimento). E há integração com o MS (Min. da Saúde) onde, mesmo?? 

Sabe o Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral (MS, 2006)? Leia e me fale a respeito de determinação de áreas vulneráveis. E me fale também a respeito se, hipoteticamente, você resolvesse pesquisar LV canina em uma cidade, a priori de ocorrência silenciosa e, ainda hipoteticamente, você envia para diagnóstico sorológico ao principal laboratório de saúde pública daquele estado, voltam resultados de 20 animais positivos e, na recoleta, não sobra sequer UM animal positivo? 1- o que significa casos positivos autóctones em uma área silenciosa?; 2- o que acontece com o município (quanto a VERBA repassada para saúde pública), que sai do status silencioso e passa a ter casos autóctones?; 3- serão todos falso-positivos porque, em área de baixíssima prevalência o valor preditivo do teste é comprometido?; 4- serão todos casos de reação cruzada com qualquer outra doença? 5- eram positivos para LV ou leishmaniose tegumentar?? Por isso reflito no quanto a política interfere nos "resultados" de uma pesquisa e no quanto ainda não temos ferramentas diagnósticas ótimas frente às leishmanioses e diferenciação destas.


Quando se trata de protozoários, o mistério é infinito. Eu ainda DUVIDO de uma vacina eficaz contra protozoários. Espero que eu "morda minha língua" o quanto antes, mas ainda não chegamos nem próximo de vacina realmente protetora contra protozoários. E se a vacina fosse tão über, por quê não desenvolver e disponibilizar para humanos - o foco da saúde pública? Ok, está em desenvolvimento... Mas e do vetor? Ninguém fala  / faz nada? Até Aedes aegypti já tem versão transgênica mutante...

Deixemos esclarecido: sou a favor de vacina, não sou xiita frente a eutanásia e tratamento de cães. Mas somente UMA medida NÃO resolve e NÃO controla a doença! Pensem! Integrem! Afinal, pra que serve a EPIDEMIOLOGIA???

Somebody save me!

Sobre outras publicações do Ministério da Saúde, acesse o site da Editora do MS aqui. 

2 comentários:

David Soeiro disse...

Ju, bem interessante seu post. Compartilho de várias opiniões/questões deixadas nele. Não dá pra fazer políca de saúde pública com jogo político sem critério científico.

Juliana Arena Galhardo disse...

Oi David!
Esse post caberia no Vet e Saúde Pública, mas como a linguagem é bem pessoal, resolvi postar aqui.
Lutemos para melhorar essa cara de "emergência" na saúde pública!!